Enem do servidor federal vai oferecer em 2024 mais de 7 mil vagas

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A partir de 2024 haverá uma prova nacional unificando o processo de seleção de servidores federais, um Enem dos Concursos”, como o objetivo de facilitar o acesso da população às provas, inclusive em cidades do interior. A primeira prova será realizada no dia 24 de fevereiro.  A estimativa de vagas é de mais 7 mil no primeiro ano do concurso, Provas serão simultaneamente em 179 cidades das 5 regiões Cada ministério poderá decidir se vai aderir a esse modelo ou fazer os concursos por conta própria. O exame acontecerá ao mesmo tempo em 179 municípios, sendo 39 na Região Norte, 50 no Nordeste, 18 no Centro-Oeste, 49 no Sudeste e 23 no Sul. Haverá duas provas no mesmo dia. Uma com questões objetivas, comum a todos, e outra com perguntas específicas e dissertativas, divididas por blocos temáticos. Os candidatos para Trabalho e Previdência farão a mesma segunda prova, por exemplo; já os candidatos para Administração e Finanças Públicas, outra. As vagas abrangem os seguintes setores: Administr

Por que a extrema-direita brasileira ama a Idade Média europeia

por Paulo Pachá
para Pacific Standard Magazine

No dia da posse de Jair Bolsonaro como presidente do Brasil, Filipe Martins, um blogueiro político próximo à família Bolsonaro, twittou sua celebração pessoal da vitória de Bolsonaro: A Nova Ordem está aqui. Tudo é nosso! Deus vult!

Os observadores seriam perdoados por se perguntarem por que “Deus vult” — Latim para “Deus deseja”, um grito de guerra medieval associado à Primeira Cruzada — está reaparecendo no Brasil do século 21.

Nos últimos anos, a linha “Deus Vult” foi apropriada pela extrema direita na Europa e nos Estados Unidos, e agora se tornou um slogan para a extrema direita no Brasil.

Na verdade, Martins já havia vinculado explicitamente esse grito de guerra às Cruzadas quando ele twittou no dia do segundo turno das eleições: A nova Cruzada é decretada. Deus vult!

Em 3 de janeiro, Bolsonaro nomeou Martins como assessor especial presidencial para assuntos internacionais.

No Brasil de Bolsonaro, o novo governo e grupos de extrema direita estão propagandeando uma versão fictícia da Idade Média europeia, insistindo que o período era uniformemente branco, patriarcal e cristão.

Este revisionismo reacionário apresenta o Brasil como a maior conquista de Portugal, enfatizando uma continuidade histórica que molda os brasileiros brancos como verdadeiros herdeiros da Europa.

Desta forma, através de uma visão genética da história, a extrema direita enquadra a história brasileira como essencialmente ligada ao próprio passado medieval imaginariamente puro de Portugal.

A maneira mais comum de expressar essa associação é proclamar a chamada tradição judaico-cristã como o principal pilar da cultura brasileira.

Tal retórica serve para indicar que o Brasil é uma nação cristã e, como resultado, é uma orgulhosa parte da civilização ocidental.

O estado brasileiro vem impulsionando essa narrativa histórica desde o século XIX.

Portanto, afirmar as ligações identitárias do Brasil com a Idade Média europeia é também afirmar um conjunto de projetos políticos conservadores antigos e muito específicos.

Em seu discurso de posse, Bolsonaro prometeu ‘unir o povo, valorizar a família, respeitar as religiões e nossa tradição judaico-cristã, opor-se à ideologia de gênero e preservar nossos valores’.

Sua referência à suposta “tradição cristã” do Brasil foi similarmente um marco de seus discursos durante a campanha.

Em setembro passado, durante um comício de campanha em Campina Grande, Bolsonaro disse a seus partidários: “Dado que somos uma nação cristã, Deus acima de tudo!” (Mais tarde, no mesmo discurso, ele acrescentou: ‘Nada mais desse conto do estado secular! É um estado cristão’.)

Finalmente, o slogan de Campanha de Bolsonaro era ‘o Brasil acima de todos, Deus acima de tudo’ — um toque religioso no slogan nazista Deutschland über alles.

A centralidade dessa ideia sobre uma “tradição judaico-cristã” é generalizada entre os grupos de extrema direita brasileiros.

Kim Kataguiri, líder do Movimento Brasil Livre [MBL], eleito representante do Congresso em 2018, destacou a mesma ideia durante uma entrevista de 2017, dizendo a um entrevistador: Em nossos vídeos [MBL], falamos sobre os pilares da civilização ocidental, que são a filosofia grega, o direito romano e a religiosidade judaico-cristã.

Essas ideias têm força social entre os eleitores de direita e a população em geral no Brasil.

Um documentário de 2017 chamado Brazil: The Last Crusade foi produzido e lançado no YouTube pela organização de extrema direita Brasil Paralelo (“Parallel Brazil”), um canal com mais de 700.000 assinantes; o documentário agora tem mais de 1,5 milhões de visualizações.

O primeiro episódio, “A Cruz e a Espada”, apresenta uma breve história da civilização ocidental na Idade Média.

Repleto de islamofobia, o episódio centra-se na conquista árabe da Península Ibérica e nas Cruzadas, destacando o papel dos Cavaleiros Templários na história europeia e portuguesa, incluindo a chamada Reconquista.e a expansão no exterior.

Os cineastas enfatizam como a conquista portuguesa e o domínio colonial estabeleceram a herança europeia como a essência mais profunda do Brasil, ligando a nação futura ao legado da Idade Média europeia.

De fato, a ideia da civilização ocidental é uma construção política recente, destinada a legitimar processos políticos e históricos específicos, o imperialismo e o colonialismo entre eles.

Ao retratar a Idade Média europeia como o verdadeiro passado da nação, a extrema-direita branqueia sua própria história e a crueldade de sua prática política, especialmente (mas não apenas) a persistência de racismo ativo, misoginia, homofobia e intolerância religiosa.

O racismo é um elemento estrutural da sociedade brasileira. O Brasil foi o último país das Américas a abolir a escravidão em 1888.

Em 2017, 70% de todos os assassinatos no Brasil vitimizaram os afro-brasileiros. Mais de 60% dos presos no Brasil são negros.

Da mesma forma, a violência de gênero e a misoginia são fatos centrais da vida brasileira: o Brasil é o quinto país mais perigoso do mundo em mortes violentas de mulheres.

Além disso, o Brasil é uma das nações mais perigosas para as pessoas LGBT, com dezenas de assassinatos homofóbicos registrados a cada ano.

Finalmente, a intolerância religiosa tem aumentado nas últimas décadas. A maioria da população brasileira se identifica como cristã (principalmente católica e evangélica), mas existe uma imensa diversidade na prática espiritual.

Os adeptos das religiões afro-brasileiras são os principais alvos dos atos de intolerância.

Nesse contexto, o Brasil oferece um terreno fértil para uma versão imaginada da Idade Média europeia que a extrema direita apresenta como branca, patriarcal e cristã.

Ao enfatizar a relação entre o Brasil e Portugal, a extrema direita apaga a importância dos povos indígenas e africanos na história do Brasil e ignora suas contribuições sociais, culturais e econômicas.

Neste passado imaginário, Portugal não é enquadrado como uma potência colonial distante, mas como a “pátria mãe” que deu aos brasileiros uma língua e cultura europeias.

Gilberto Freyre notoriamente desenvolveu o mito de uma democracia racial no Brasil: a coexistência pacífica das “três raças”. Na versão de extrema-direita da história, estamos de volta a uma visão ante-freiriana: um passado limpo e branco para o Brasil.

No entanto, o objetivo dos demagogos que se apropriam da Idade Média europeia dessa maneira não é apenas reconstruir o passado.

Como os historiadores sabem, o presente e o passado estão ligados; reescrever a história do Brasil também é pressionar por um projeto específico para o futuro.

Como disse Bolsonaro durante sua campanha em Campina Grande: Vamos construir um Brasil para as maiorias! Minorias devem se curvar para as maiorias! A lei deve existir para defender maiorias! Minorias devem se adaptar ou simplesmente desaparecer!

A plataforma política de Bolsonaro é construir um país em que o cristianismo conservador desfrute de um domínio incontestado, a família patriarcal seja a sede do autoritarismo doméstico e o racismo, a homofobia, a misoginia e a intolerância religiosa estejam codificados na vida cotidiana.

Cumprindo suas promessas de campanha, o governo Bolsonaro já encerrou importantes políticas públicas que ofereciam proteções a grupos marginalizados.

A melhor maneira de descrever o governo de Bolsonaro é como uma reação reacionária: uma reação conservadora agressiva aos modestos passos progressivos que o Brasil adotou nas últimas décadas.

Examinando quão importante é a ideia de uma Idade Média europeia pura e branca para a extrema direita brasileira, podemos vislumbrar os princípios fundamentais que guiarão este governo e o movimento social mais amplo que lhe dá força.

Nesse sentido, é importante ressaltar que a extrema direita brasileira (incluindo o governo Bolsonaro) não quer “tornar o Brasil medieval de novo”, mas sim evocar um conjunto de ideias sobre a Idade Média europeia como um passado idealizado que forneça elementos para a construção de um futuro nobre.

O uso da Idade Média pela extrema direita é um problema global, com surtos específicos nos EUA e na Europa Ocidental.

Futuros cruzados brasileiros sabem disso.

Paul Joseph Watson, de extrema-direita inglesa, entrevistou Martins logo após a vitória de Bolsonaro no primeiro turno das eleições.

Da mesma forma, em 2018, tanto Martins quanto Eduardo Bolsonaro, o filho do presidente, estavam em contato com o organizador americano de extrema-direita Steve Bannon.

Eduardo Bolsonaro chegou a se gabar de que ele e Bannon estavam unindo forças “contra o marxismo cultural”.

Há trabalho a ser feito no Brasil, mas também em todo o mundo acadêmico. No ensino e na erudição, os medievalistas devem se opor à extrema direita e dispensar esses mitos.

A nova Idade Média “global”, baseada em olhar para além da Europa Ocidental e abraçar as verdadeiras complexidades de um mundo multiétnico e polireligioso, com sujeitos ativos de diversos gêneros, terá que enfrentar a supremacia branca global.

Paulo Pachá é professor assistente de história medieval na Universidade Federal Fluminense no Brasil.

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