'A Igreja tem hierarquia pouco democrática' (Estadão)
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Alexandre Rodrigues
Prestes a completar 91 anos, d. Clemente Isnard (foto) conserva o espírito jovem de um revolucionário. Descontente com uma Igreja Católica rigidamente hierarquizada e conservadora, o monge beneditino dedica boa parte do tempo de sua aposentadoria a escrever sobre temas polêmicos. Bispo emérito de Nova Friburgo (RJ), onde atuou por mais de 30 anos, d. Clemente defende o fim da exigência do celibato para sacerdotes e a ordenação de mulheres. Para ele, há religiosas prontas para dirigir paróquias e ex-padres que trocaram a vocação pastoral pelo casamento que fazem falta à Igreja.
No pequeno livro Reflexões de um Bispo Sobre as Instituições Eclesiásticas Atuais, lançado recentemente, ele - um dos poucos sacerdotes brasileiros que participaram do Concílio Vaticano II - também defende a democratização da Igreja, com a participação dos leigos na eleição de bispos. Morador do Mosteiro de São Bento, no Rio, d. Clemente passa uma temporada no Recife, de onde concedeu entrevista ao Estado por e-mail.
Em seu livro, o senhor aborda temas delicados para a Igreja Católica, como o celibato, a ordenação de mulheres. Por que o senhor decidiu escrever sobre isso agora?
Porque me parecem de grande atualidade. A ordenação de mulheres acaba de ser proposta na Europa pelo cardeal Martini e tem aprovação do cardeal Lorscheider no seu livro Mantenham as Lâmpadas Acesas. Não propus o fim do celibato eclesiástico, mas apenas a possibilidade de dispensar bons sacerdotes do celibato para continuarem o ministério. Não são casados os padres das Igrejas Orientais?
Na opinião do senhor, a exigência do celibato favorece personalidades perturbadas, como a dos padres envolvidos em pedofilia?
A exigência do celibato traz uma carga psicológica que pode favorecer personalidades desequilibradas, embora não sempre. O celibato, como resposta ao convite do Evangelho e da Epístola de São Paulo aos Coríntios, deverá existir sempre na Igreja. Os monges deverão ser sempre celibatários.
O senhor acredita que, se pudessem constituir família, os padres poderiam se dedicar ao trabalho pastoral da mesma forma?
Não impediria o trabalho habitual de um pai de família. Tudo depende da vocação.
O senhor também defende a ordenação de mulheres.
A ordenação sacerdotal das mulheres é uma praxe adotada nas Igrejas Anglicana e Luterana. Dois cardeais modernos, Lorscheider e Martini, são favoráveis. Sem dúvida Ione Buyst teria competência para dirigir uma paróquia. Irmã Penha Campanedo também.
O senhor acha que, se houvesse maior poder de decisão dos fiéis na escolha dos líderes da Igreja, as pessoas se aproximariam mais dela? O senhor ousaria defender uma participação direta dos fiéis na escolha do papa?
Penso que um grupo de leigos, homens e mulheres, que ajudariam a eleger o bispo, faria a comunidade diocesana mais próxima dele. Quanto à eleição do papa, que é bispo de Roma, concordo com a opinião do cardeal Lorscheider: “Deve-se dissolver o Colégio Cardinalício e fazer o papa ser eleito pelos presidentes das Conferências Episcopais”.
É verdade que o Núncio Apostólico tentou impedir a publicação do seu livro?
O Núncio Apostólico chamou o Provincial dos Padres Paulinos, que iam publicar meu livro, e proibiu a publicação. Mas não se dirigiu a mim. Procurei então, tranqüilo, outra editora, pois o livro nada contém contra a fé e as leis da Igreja. A Santa Sé publicou um livro onde se diz que o bispo emérito, como sucessor dos apóstolos, pode pregar. Se pode pregar, pode escrever.
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